Ministro de Lula que voou de FAB para leilão não declarou R$ 2 milhões em cavalos de raça, diz jornal
Juscelino Filho, ministro das Comunicações do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), teria ocultado da declaração de bens ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), na eleição passada, a propriedade de pelo menos 12 cavalos de raça adquiridos em leilões, estimados em R$ 2 milhões, e ainda utilizado um voo da Força Aérea Brasileira (FAB) para um compromisso pessoal em meio a oficiais em São Paulo, no mês passado, com diárias pagas pela União.
As informações fazem parte de duas apurações publicadas pelo jornal O Estado de São Paulo na segunda (27) e terça-feira (28). A defesa de Juscelino confirmou à Gazeta do Povo o teor de uma delas, sobre a viagem a São Paulo, mas não comentou a ocultação dos animais à Justiça Eleitoral.
Segundo o jornal, durante a campanha ao cargo de deputado federal em 2022, Juscelino Filho teria deixado de declarar a propriedade dos animais à Justiça Eleitoral, avaliados em R$ 2,2 milhões.
Os cavalos da raça Quarto de Milha são criados no haras da irmã dele, Luanna Rezende, no município de Vitorino Freire (MA). Ela é prefeita da cidade e teria recebido R$ 5 milhões em verbas das emendas de relator que foram usadas para pavimentar uma estrada de 19 quilômetros que passa pela propriedade.
A apuração do Estadão levantou o patrimônio do ministro cruzando informações de entidades de criadores e de negociantes de animais a partir do registro de cavalos em nome de Juscelino, na base de dados da Associação Brasileira de Quarto de Milha (ABQM). A entidade é reconhecida pelo Ministério da Agricultura e contém a propriedade de “José Juscelino dos Santos Rezende Filho” dos equinos adquiridos em leilões em Alagoas, Ceará, Maranhão, São Paulo e Sergipe.
A reportagem ainda analisou 56 horas de gravações de 14 pregões que tiveram a participação do ministro. Em um dos leilões, realizado em 2020, Juscelino é ovacionado pelos organizadores, com dizeres como “comprador é Parque & Haras Luanna, é Vitorino Freire, Maranhão, é o nosso deputado federal Juscelino Filho”.
De acordo com a apuração do Estadão, Juscelino é presença constante em leilões de cavalos de raça, embora não publique em suas redes sociais como faz com as atividades parlamentares, mesmo quando está em viagens oficiais do governo. A reportagem apurou que, no dia 11 de fevereiro, o ministro participou remotamente de um evento pela internet, durante um compromisso oficial em Portugal.
“Está lá direto de Portugal nos assistindo, é nosso ministro das Comunicações, Juscelino Filho, mandando um abraço”, disse o locutor do evento em um trecho da gravação.
O Estadão apurou que, em eleições passadas, Juscelino também não declarou ao TSE a propriedade dos animais, apenas fazendas, carros, aeronave, um apartamento e o terreno onde o haras está instalado, que somam R$ 4,457 milhões. O valor, diz a reportagem, é semelhante aos R$ 4,426 milhões que ele movimentou em leilões desde 2028, que inclui a venda de 14 cavalos de raça.
Segundo o advogado eleitoral Walber de Moura Agra, a omissão de bens à Justiça Eleitoral pode acarretar “efeitos em três searas: nas áreas tributária, um crime de sonegação fiscal, eleitoral e penal eleitoral, falsidade ideológica”.
Voo da FAB para participar de um leilão
A segunda apuração do Estadão aponta que o já empossado ministro das Comunicações utilizou um avião da Força Aérea Brasileira para viajar de Brasília a São Paulo, no dia 26 de janeiro de 2023, para participar de três compromissos oficiais marcados como “urgente” – no entanto, estendeu a viagem para compromissos pessoais, com diárias pagas pela União no valor de R$ 3 mil.
Segundo o Estadão, a agenda oficial do ministro previa apenas um compromisso na sede da operadora Claro, onde permaneceu por uma hora; um no escritório da Telebrás, de 30 minutos; e encontros oficiais à representação da Anatel, de mais uma hora. No restante do fim de semana, Juscelino permaneceu em São Paulo em uma agenda particular.
Já as marcações pessoais incluíram a assessoria a compradores de animais, promoção dos próprios cavalos, o recebimento de um prêmio de vaqueiros, e a inauguração de uma praça na cidade de Boituva (SP) em homenagem a um equino de seu sócio, o empresário Jonatas Dantas. Durante o ato, Juscelino se apresentou como integrante da “equipe do presidente da República”, embora o evento não constasse na agenda oficial do ministro, segundo o Estadão.
Juscelino também aproveitou a viagem para participar de um leilão na cidade, sendo citado pelo locutor do pregão: “Você já ‘lançou’ num leilão e teve a assessoria de um ministro? O comprador ‘tá’ com assessoria do ministro. […] O comprador do lote 8 foi com a assessoria do nosso ministro Juscelino Rezende. Vai para Serraria, no Estado da Paraíba”, disse em um dos vídeos obtidos pela reportagem.
O que diz a defesa do ministro
Em uma nota à Gazeta do Povo, os advogados Ticiano Figueiredo e Pedro Ivo Velloso afirmam que a viagem de Juscelino a São Paulo cumpriu uma agenda oficial “com claro interesse público, o que justifica o uso do transporte da FAB, assim como retornou a Brasília em voo solicitado por outro colega ministro”.
“Não houve qualquer ilegalidade por parte do ministro Juscelino nas agendas e, como forma de demonstrar seu zelo com o dinheiro público e seu compromisso com a transparência, o ministro determinou apuração sobre os procedimentos administrativos relacionados à viagem”, completa a defesa do ministro.
De acordo com a Força Aérea Brasileira, os voos oficiais são disponibilizados para autoridades como o vice-presidente da República; presidentes do Senado, da Câmara e do Supremo Tribunal Federal; ministros de Estado e comandantes das Forças por motivos de segurança e emergência médica; em viagens a serviço e deslocamentos para o local de residência permanente.
No entanto, a FAB não pode “questionar qualquer autoridade sobre detalhes da missão em andamento”.
Fonte: Gazeta do Povo.