Oposição cogita impeachment de ministro de Lula; PT e União Brasil pedem calma
A oposição ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) trabalha com duas estratégias para engrossar a pressão contra o governo federal e o ministro das Comunicações, Juscelino Filho (União Brasil), que voou em uma aeronave da Força Aérea Brasileira (FAB) para participar de um evento de leilões de cavalo e omitiu a declaração de R$ 2 milhões em cavalos de raça ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Um dos planos envolve o pedido de impeachment do ministro.
A oposição não chegou a uma unanimidade em torno da estratégia, mas é consensual o entendimento sobre a necessidade de fiscalização em relação às denúncias contra o ministro.
As denúncias relacionadas ao uso de aviões da FAB e a omissão dos cavalos de raça para a Receita foram reveladas pelo jornal O Estado de S. Paulo. O parlamentar também foi acusado em uma reportagem da Folha de S.Paulo de receber diárias do governo federal por dias sem agenda de trabalho em São Paulo, Maranhão, Portugal e Espanha. Ele teria viajado com muita antecedência para compromissos no exterior e recebido verbas para despesas pessoais nesses dias.
Uma ala entre os opositores defende a aprovação de um requerimento de convocação de Juscelino Filho, após a instalação das comissões permanentes, para que o ministro esclareça as denúncias.
O deputado federal Evair Vieira de Melo (PP-ES) destaca que as denúncias são “muito graves e contundentes” e sugerem um “desvio de conduta realmente lamentável” para um ministro. Mas sustenta que o primeiro procedimento a ser adotado é convocá-lo, e depois tomar outra decisão após ouvir os esclarecimentos. A convocação de um ministro de Estado prevê a obrigação de comparecimento sob pena de incorrer em crime de responsabilidade.
“O ministro [Juscelino Filho] está em viagem internacional e as comissões não estão instaladas. Assim que forem instaladas, o procedimento vai ser a convocação dele. Diante da performance, a oposição vai decidir que ação adotar como consequência [das denúncias]”, afirma Melo. Cotado para assumir a liderança da minoria, um espaço de oposição, o parlamentar considera que a suspeita de uso da aeronave da FAB para fins pessoais “mancha o currículo de qualquer pessoa que está na vida pública e envergonha a classe política brasileira”.
A estratégia tem o apoio do deputado Kim Kataguiri (União Brasil-SP), que defende uma permanente prestação de contas por membros do Executivo ao Parlamento. “Na convocação, ele seria obrigado a falar e se explicar. E acho que a explicação vai dar repercussão, que dificilmente seria positiva”, pondera. Quanto a um pedido de impeachment, ele discorda. “É inócuo, o PGR [procurador-geral da República, Augusto Aras] é velho amigo dos petistas, e no Supremo [Tribunal Federal] não vejo nenhum clima. Pode gerar mídia e like aos bolsonaristas, mas não gera resultado”, diz.
Outra ala da oposição é reticente à ideia de convocação em razão do ministro das Comunicações ser deputado federal licenciado e ter proximidade com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e o líder do União Brasil, Elmar Nascimento (BA). Soma-se a isso a hipótese de a base governista se articular para substituir o requerimento de convocação por um de convite, o que, se aprovado, desobrigaria o comparecimento à Casa. Caso o ministro não comparecesse na condição de convidado, opositores dizem que não haveria dificuldades em convocá-lo.
Em razão da discordância sobre a estratégia de convocação, um imediato pedido de impeachment contra o ministro das Comunicações é defendido por outra parcela da oposição. O deputado federal Paulo Bilynskyj (PL-SP) é quem elabora a ação e sua meta é protocolá-la ainda nesta quarta-feira (1º) na Procuradoria-Geral da República (PGR). Ele conta com o apoio de opositores de seu partido e de outros para avançar com a estratégia.
O deputado explica que a oposição tem dividido o trabalho de fiscalização e enfrentamento ao governo de acordo com temas que cada um tem mais afinidade e consegue “abraçar”. Pela experiência como delegado da Polícia Civil de São Paulo, corporação onde atuou por 10 anos, ele se prontificou a propor os pedidos de impeachment. “Vou convidar todos os meus colegas que tenham interesse em subscrever a peça a participar”, diz Bilynskyj.
Publicamente, alguns deputados têm se posicionado criticamente sobre as denúncias no Twitter. “Que diferença dos ministros do Bolsonaro”, comentou Nikolas Ferreira (PL-MG). “Ele ainda é ministro de Lula”, endossou Carla Zambelli (PL-SP). “O governo comunista mal começou e já temos mais um escândalo pra conta do amor”, disse Júlia Zanatta (PL-SC). “Brasil é o país da piada pronta. O único projeto de Juscelino Filho em 2022 como deputado foi o Dia do Cavalo”, criticou Luiz Lima (PL-RJ).
Pedido de impeachment de Juscelino Filho está amparado na lei de responsabilidade
A abertura de processo de impeachment de ministros de Estado está prevista na Lei 1.079/50, que define os crimes de responsabilidade. Na gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), ela foi usada pela oposição ao então governo para pedir o impeachment de ex-ministros, como Ricardo Salles e Abraham Weintraub, então ministros do Meio Ambiente e da Educação, respectivamente.
Agora, o objetivo da atual oposição a Lula é fazer o mesmo. O deputado Paulo Bilynskyj já pediu o impeachment dos ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e da Casa Civil, Rui Costa, por nepotismo cruzado após a mulher do chefe da equipe econômica ser nomeada para um cargo no Ministério da Saúde.
O deputado entende que as denúncias contra Juscelino Filho são graves e, em razão de o ministro ter foro privilegiado, elas precisam ser analisadas pela PGR, para que as medidas cabíveis sejam adotadas, como pedido de abertura de inquérito ao Supremo Tribunal Federal (STF). O pedido de impeachment sugere que o auxiliar de Lula feriu “ao mesmo tempo” os cinco princípios da administração pública: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
“Os fatos narrados se comunicam entre si e configuram crime de responsabilidade”, diz. O deputado já está redigindo um argumento jurídico para embasar um pedido de impeachment. Antes disso, porém, Bilynskyj destaca que oficiou o ministro, em 15 de fevereiro, para prestar esclarecimentos sobre a denúncia de ter enviado 1 mil chips de celular para serem utilizados nas operações humanitárias que ocorrem na terra indígena Yanomami, em Roraima.
A denúncia aponta que os chips não funcionam dentro da área demarcada por não haver cobertura da operadora de telefonia móvel. Segundo o deputado, Juscelino Filho não respondeu ao ofício. “Ele não respeita os princípios da administração pública, ele não se enxerga como um servidor, um ministro”, critica o deputado da oposição.
Bilynskyj reforça a expectativa de protocolar o pedido de impeachment ainda nesta quarta, mas destaca que o objetivo é elaborar uma ação detalhada que não dê margem para ser rejeitada e arquivada pela PGR. “O documento precisa ser bem construído, minha experiência jurídica diz que uma coisa é eu fazer um ofício para a PGR dizendo: ‘acho que houve crime de responsabilidade’. Outra coisa é eu amarrar de uma forma tão bem escrita e colocada que ela não tenha como se desvencilhar, esse é o meu objetivo”, diz.
Além dessas questões, há mais um pedido de investigação contra o ministro. O deputado Sanderson (PL-RS) enviou uma representação à PGR para que Juscelino Filho seja investigado pelo suposto crime de tráfico de influência junto à Superintendência da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevafs) do Maranhão. O pedido do parlamentar gaúcho cita informações divulgadas pela imprensa de que o ministro teria pedido a contratação de uma empreiteira para a execução da um contrato de
R$ 54 milhões em obras com a Codevafs.
Fonte: Gazeta do Povo – Por Rodolfo Costa / Brasília