sexta-feira, maio 3, 2024
BRASIL E MUNDODESTAQUENOTÍCIAS

O P I N I Ã O

Fim do mistério: desvendamos o documento assinado por Bolsonaro em foto enigmática

Por Paulo Polzonoff Jr. (*)

Bolsonaro escreve cartinha a Papai Noel.| Foto: Reprodução/ Twitter

Querido Papai Noel,

Se não for abusar de sua generosidade natalina, antes de qualquer coisa gostaria muito de pedir ao senhor que tanto os meus apoiadores quanto os meus detratores em sua equipe de duendes-leitores avançassem pelas linhas que se seguem com algum bom humor. Não precisa ser muito. Um pouquinho só já basta e ajuda.

Porque a coisa está feia, Papai Noel. Tão feia que eu pretendia escrever que está preta, mas pensei duas vezes. E desisti. Imagine as manchetes dos jornais no dia seguinte! “Presidente usa termo racista em carta para Papai Noel”. Está rindo? Pois não duvide. É bem capaz de arrastarem até o seu bom nome para a lama. E aí a manchete seria outra e, de certa forma, a mesma que tenho lido nos últimos quatro anos: “TSE [ou STF] autoriza mandado de busca e apreensão contra Papai Noel bolsonarista”.

Aliás, ainda não sei como não proibiram o senhor de voar com seu trenó desregulamentado pelos céus do Brasil. Ainda não sei como não substituíram a sua figura idosa, redonda e de barba hirsuta (não é palavrão, juro!) pela figura magra e isenta de cabelos de um ministro do STF. Não vou ficar surpreso se, num futuro próximo, as crianças o trocarem pelo Papai Alexandre ou pelo Papai Justiça. Ou melhor, pelo Tutor Não-Binarie Democracia. Ainda não sei como…

O que eu sei é que o senhor deve estar aí consultando seus arquivos para saber se fui um bom ou mau menino durante o ano. Poupá-lo-ei (o Temer me ajudou nessa) deste trabalho dizendo que, modéstia à parte, fui mesmo um bom menino. Mas, dependendo da fonte que o senhor consultar, é bem provável que me considere a própria reencarnação do tinhoso. E aí babau presente.

Fui um bom menino, por mais que a Vera Magalhães discorde. Basta ver os índices econômicos. Aproveite e dê uma olhadinha na taxa de homicídios. Além disso, ajudei a eleger a maior bancada teoricamente conservadora de todos os tempos. Até para a Rússia eu fui negociar fertilizantes para o agronegócio. Fiz as pazes com o Moro… E, se o senhor fizer uma comparação com os anos anteriores, também vai perceber que controlei minha língua. Ou pelo menos tentei controlá-la. Já é um começo.

Estabelecida a premissa de que, apesar da opinião contrária da Miriam Leitão et caterva, fui um bom menino em 2022, vamos aos pedidos. Eu queria uns quatro milhões de votos a mais, mas acho que está muito tarde para isso, né? Eu queria um presidente do Senado que não fosse tão covarde, mas acho que está muito tarde para isso, né? Ah, eu queria tanta coisa! Mas sempre tem essa questão do “é tarde demais”. Por isso, depois de muito pensar e dialogar com o astronauta Marcos Pontes, cheguei à conclusão de que o que eu queria mesmo era.

Intertítulo de suspense

O que eu queria era um máquina do tempo. Sei que é um brinquedo caro. Sei que vai até contra as leis da física. Mas, Papai Noel, eu queria tanto. Tanto, tanto, tanto. Por favor, Papaizinho Noel, me dá uma. Não precisa ser num DeLorean, como naquele filme lá com o Einstein. Pode ser um jipinho verde-oliva mesmo. Combina comigo. Se bem que uma máquina do tempo num tanque Urutu ficaria daora, hein? Para falar a verdade, pode ser até um fusquinha do tempo. Na atual conjuntura, não me importo.

Talvez o senhor esteja se perguntando o que farei com uma máquina do tempo. Pode ficar tranquilo. Não estou planejando cometer nenhum desatino histórico. Não vou matar Hitler nem nada do tipo. Na verdade eu só queria dar um pulinho até 2020, quando começou a pandemia. Queria sussurrar no meu próprio ouvido uns conselhos. Não fale “gripezinha”, por mais que… Bom, não fale gripezinha e ponto final. Não dê cloroquina para a ema. Não diga que não é coveiro.

Aí, se sobrasse um tiquinho de combustível no capacitor de fluxo, eu iria até 2021 e, sei lá, dava um jeito de impedir que o Lula se tornasse elegível.

Esse é o meu humilde pedido. É difícil, mas tenho certeza de que um Papai Noel como o senhor, todo garboso e patriota, não se deixa abater por esse tipo de dificuldade. No mais, ao me dar uma máquina do tempo o senhor estaria dando um presente a no mínimo 58 milhões de brasileiros que, tenho certeza, também foram bons meninos e meninas ao longo do ano.

Desde já agradeço, talquei?

PS: Se por algum motivo não rolar a máquina do tempo, me contento com um balde cheio de soldadinhos de chumbo (de plástico), igual àquele do “Toy Story”. Eu disse “balde cheio”? Que nada! Um cabo e um soldado bastam.

(*) Paulo Polzonoff Jr. é jornalista, tradutor e escritor.

Fonte: Gazeta do Povo