sexta-feira, abril 26, 2024
BRASIL E MUNDODESTAQUENOTÍCIAS

OPINIÃO: Como será a batalha do Sete de Setembro, nas ruas e na mídia

Por Luciano Trigo

Não estou dizendo que vai acontecer, mas não ficarei nem um pouco surpreso caso aconteça. Porque anunciado está: o que não falta é profeta do Apocalipse torcendo contra o Brasil e a favor do caos – nem gente disposta a provocar o caos como estratégia política.

Pois bem, contrariando decisão do governador de São Paulo João Dória, que sensatamente determinou que as manifestações a favor e contra Bolsonaro fossem realizadas em dias diferentes (por motivos óbvios), a Justiça brasileira, essa incendiária, autorizou que a oposição promova um protesto no mesmo dia que já estava reservado para a manifestação a favor do governo e do voto auditável.

Com base na História recente – mais precisamente, a partir dos protestos de junho de 2013, que analisei no artigo “O filme do vandalismo já passou. E não terminou bem para a esquerda” –, não é difícil visualizar o que pode acontecer em 7 de setembro. Os riscos são enormes. Mas ainda mais fácil é imaginar o tratamento que será dado pela mídia aos dois eventos.

Exemplos:

A manifestação da Avenida Paulista estará repleta de bandeiras do Brasil; o protesto do Vale do Anhangabaú estará coalhado de bandeiras vermelhas. Mas, segundo os imparciais comentaristas da TV, na Paulista se estará apoiando um golpe contra a democracia, e no Anhangabaú só haverá patriotas apartidários que lutam pela liberdade;

A manifestação da Avenida Paulista terá muita gente; o protesto do Vale do Anhangabaú também. Mas, na comparação entre os dois eventos, os jornalistas “do bem” seguramente enxergarão muito mais gente no Anhangabaú que na Paulista. Fotografias tiradas em pontos e momentos estratégicos serão provas incontestáveis de que o Sete de Setembro foi uma derrota para Bolsonaro, mesmo que milhões de pessoas tenham ido às ruas para apoiá-lo;

A se repetir o que aconteceu em todas as manifestações promovidas pelas chamadas direita e esquerda na última década, na manifestação da Avenida Paulista não haverá pneus queimados, nem vidraças quebradas, nem lixo espalhado, nem barricadas improvisadas, nem black blocs mascarados tocando o terror, nem vandalismo, nem pedras atiradas contra policiais; já no protesto “em defesa da democracia”, no Anhangabaú, bastará o sol se pôr para começar a barbárie.

Mas a mídia tratará a manifestação da Paulista como antidemocrática, e o protesto do Anhangabaú como uma pacífica “festa da democracia”. Se houver quebra-quebra no Anhangabaú, a legenda da foto será: “Manifestação em defesa da democracia termina em confronto com bolsonaristas”; se houver uma casca de banana ou um palito de picolé no chão da Paulista, a legenda será “Bolsonaristas promovem vandalismo”.

Na manifestação da Avenida Paulista haverá muita gente sem máscara; no protesto do Anhangabaú também (com exceção dos black blocs, é claro). Mas a mídia exaltará a preocupação fofa dos manifestantes de esquerda com a pandemia – destacando, possivelmente, a imagem de um jovem hipster com um cartaz pedindo que todos usem álcool gel; a mesma mídia condenará asperamente os fascistas genocidas da Paulista, por se aglomerarem sem pensar na disseminação do coronavírus.

Inevitavelmente, haverá imbecis e radicais dos dois lados. Mas os imbecis e radicais do Anhangabaú, mesmo que em número muito maior, serão tratados como elementos estranhos ao protesto e estrategicamente ignorados, enquanto os imbecis e radicais da Paulista, mesmo que em número irrisório, serão tratados como representativos da multidão ali reunida.

Você não verá estampada na primeira página dos grandes jornais a fotografia de nenhum manifestante “do bem” rasgando a bandeira brasileira, ou usando uma camiseta com o rosto de Stálin, nem faixas e cartazes a favor de uma ditadura comunista; mas verá, seguramente, fotos de inocentes úteis na Paulista pedindo intervenção militar – como se esta fosse a bandeira e a vontade da imensa maioria ali presente.

Aliás, qualquer cartaz na Paulista potencialmente interpretável como de “teor golpista ou antidemocrático” será destacado e criticado pela mídia indignada e defensora da democracia; já no Anhangabaú, cartazes explicitamente golpistas serão tolerados pela mesma mídia como pequenos excessos isolados. Se o golpismo for do bem, está liberado.

O partidarismo escancarado da mídia mainstream já não surpreende ninguém. Mesmo um grande jornal, tido até pouco tempo atrás como conservador, não se constrangeu em dar a um editorial o título “A convocação do golpe” e o subtitulo: “O objetivo das manifestações de 7 de setembro não é manifestar apoio a Jair Bolsonaro. É para (sic) invadir o STF e o Congresso”. Mas como? O presidente conclamou os manifestantes a fazerem isso? Onde? Quando? Se não conclamou, é muita irresponsabilidade do editorialista.

Mais graves e preocupantes que a permanente sabotagem da mídia têm sido as manifestações recentes de alguns ministros do STF, que há muito deixaram de lado até mesmo a aparência de imparcialidade para abraçar abertamente uma agenda de resistência e combate ao presidente (que, por péssimo que seja na cabeça de muitos, não chegou ao Planalto por meio de um golpe: ele foi eleito com quase 58 milhões de votos, vale lembrar). A ponto de um ministro ter declarado: “É preferível evitar que o cão morda”.

Essa atitude do Judiciário – que remete ao filme “Minority Report – A Nova Lei”, de Steven Spielberg, uma distopia na qual as pessoas são presas antes de cometer crimes – tem servido para justificar medidas como censura, processos por crime de opinião, bloqueio de contas de jornalistas em redes sociais etc.

Tudo em nome da defesa da democracia, e sempre com aquele ar de superioridade moral de quem se sente no direito de calar, perseguir, agredir e esfolar qualquer pessoa que pense de forma diferente. Porque para tudo tem limite, até para o pensamento; e a liberdade de expressão, como aprendemos outro dia, só vale para fatos cientificamente comprovados.

A verdade é que muita gente, inconformada com a alternância no poder pelo voto, adotou a estratégia de apostar no “quanto pior melhor” e no “ganhou, mas não vai levar”. Como ensinou um grande líder revolucionário, acuse os adversários do que você faz, chame-os do que você é!

Nessa estranha ditadura que nenhum autor de ficção científica foi capaz de imaginar, não é um governo opressor quem censura e persegue a oposição; ao contrário, são aqueles que tentam derrubar o governo eleito que censuram e perseguem abertamente quem o apoia. É uma fábula às avessas, na qual os supostos cordeiros estão autorizados a matar e devorar os supostos lobos.

Em seu novo papel de curador da sociedade, o próprio Judiciário parece se mirar no general João Batista de Figueiredo, que, defendendo a abertura política em 1978, afirmou: “Quem for contra a abertura, eu prendo e arrebento!” Ou seja, quem tem a convicção de ter razão acha certo e justo… prender e arrebentar.

Pelo andar da carruagem, em breve qualquer juiz se sentirá à vontade para declarar: “Quem for fascista, eu mando prender!” E os grandes jornais irão apoiar, porque tudo é permitido a quem odeia Bolsonaro: na defesa da democracia e da liberdade, até a censura foi reabilitada. Até que esses fascistas aprendam!

(Mas quem decide quem é fascista? Ora, é simples: fascista é todo aquele que apoia o presidente genocida, que deliberadamente provocou a morte de mais de 500.000 brasileiros na pandemia. Ah, tá.)

Pois bem, pouco mais de 30 minutos de caminhada em linha reta separam a Avenida Paulista do Vale do Anhangabaú. Já vimos, em um passado não muito distante, manifestantes do bem enfurecidos fazendo esse trajeto. Com o ambiente de confronto criado e diariamente alimentado pela mídia e pelo Judiciário – que vêm se empenhando com afinco em jogar gasolina no incêndio – será difícil impedir que os dois grupos se encontrem, provavelmente depois que escurecer. E, se os dois grupos se encontrarem, será inevitável o confronto violento.

Tomara que não aconteça. Mas a bomba está armada.

Fonte: Gazeta do Povo