segunda-feira, maio 6, 2024
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OPINIÃO: Não está mais aqui quem roubou

Por Guilherme Fiuza (*)

Os ex-presidentes Lula e Fernando Henrique Cardoso| Foto: Ricardo Stuckert / Instituto Lula

Lula e Fernando Henrique conversam ao telefone (diálogo na margem de erro do Datafolha):

– Obrigado, Fernando.

– Por quê?

– Por você ter dito que vai votar em mim.

– Eu disse isso?

– Ué, foi o que eu li por aí. Será que era fake news?

– Acho que não. Eu disse mesmo. Quer dizer, não foi bem isso que eu disse.

– Porra, Fernando. Assim você me confunde. Tá comigo ou não tá?

– Não vem com essas perguntas de programa de auditório. O mundo é mais complexo que isso.

– Complexo é coisa de boiola. Ops, desculpe. Não pode mais falar isso. Enfim… Complexo é coisa de fresco.

– Você mudou uma palavra mas manteve o seu preconceito intacto.

– Caceta, Fernando. Como é difícil conversar contigo. Conto ou não conto com o seu voto?

– O voto é secreto.

– Mas você disse publicamente que votaria em mim!

– O que sai na imprensa mais de um ano antes da eleição é uma coisa, o que se faz na solidão da urna é outra.

– Então você falou por falar?!

– Claro que não. Nunca falo por falar.

– Que saco. Na próxima encarnação, em vez de parasita eu vou vir traça. Pra comer todos os seus livros e te salvar desse rebolado intelectual que ninguém entende.

– Você devia ler mais.

– Deus me livre. Pra falar errado que nem você?

– O que eu falei errado?

– Quem fala o que ninguém entende, fala errado.

– Só não me entende quem não lê.

– Se você me despreza por que disse que vai votar em mim?

– Porque, pra um intelectual, pega bem defender uma besta como você.

– Ah, então você confirma que vai votar em mim. Pelo menos isso.

– Se for contra esse presidente aí, sim.

– Obrigado. Você acha que eu sou melhor que ele, né?

– Não. Acho que você é mimado pela imprensa e pela intelectualidade que me deixam bem na foto.

– Faz sentido. Uma mão lava a outra. Se bem que no meu caso, com tudo que eu roubei, é mais provável uma mão sujar a outra.

– Jamais repita isso.

– Ué, parceiro? Quer apoiar ladrão e ficar com a mão limpinha? Tu tem uma biografia ou uma lavanderia?

– Lula, você sempre foi grosseiro. Mas o seu linguajar agora está abaixo da crítica. Assim vai ser difícil continuar a conversa.

– Que isso, Fernando? Só falei o que todo mundo sabe.

– Engano seu. Há um esforço gigantesco unindo jornalistas, professores, juízes e muita gente boa para ressuscitar em você aquela cantilena do proletário perseguido pelas elites e você me vem com essa história de ladrão. Meça suas palavras.

– Tá bom, você tem razão. Não falo mais de assalto. Não está mais aqui quem roubou. Mas o dinheiro não preciso devolver, né? Porque aí já seria demais.

– Vou fingir que não ouvi.

– Combinado. Vou fingir que não roubei. Mas… E se não colar?

– A epistemologia do nexo causal à luz da imanência do ser ou não ser venal refrata uma miríade de representações da coisa em si, do seu simulacro e do seu espectro projetado ao infinito de modo que, a partir do olhar multimodal embotado pelo distanciamento odebrechtiano, tudo cola.

– Você é um gênio, Fernando.

– São seus olhos, Lula.

(*) Guilherme Fiuza é um dos colunistas da Gazeta do Povo (PR)

Fonte: Gazeta do Povo

**Os textos do colunista não expressam, necessariamente, a opinião do Jornal Além Parahyba.