Câmara cogita resgatar projeto de Paulo Guedes na reforma do Imposto de Renda

O Congresso está analisando a proposta do governo para reforma do Imposto de Renda, e uma coisa é certa: o horizonte é de mudanças. Relator do texto, o ex-presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL) disse a interlocutores que pretende resgatar trechos do projeto apresentado pelo então ministro da Economia Paulo Guedes em 2021, no governo de Jair Bolsonaro (PL).
Na época, o plano de Guedes chegou a ser aprovado pelo plenário da Casa, com diversas alterações, mas depois foi “enterrado” no Senado. Não está claro, porém, quais trechos Lira cogita incorporar.
A proposta do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem dois pontos principais: a isenção do IR para quem ganha até R$ 5 mil, com descontos até R$ 7 mil; e a criação de um imposto mínimo sobre rendas acima de R$ 50 mil mensais, que inclui a retenção de 10% dos dividendos distribuídos por empresas.
A isenção de R$ 5 mil era visada por Bolsonaro, pois havia sido uma promessa de sua campanha eleitoral em 2018. No entanto, Guedes argumentou que o país passava por dificuldades em 2021, e a alternativa foi elevar a isenção de R$ 1,9 mil para R$ 2,5 mil mensais, apesar da pressão do ex-presidente para aumentar o teto para R$ 3 mil.
Naquele momento, o Brasil tinha 31 milhões de declarantes do IR, dos quais 10,7 milhões eram isentos. A proposta de Guedes faria com que 5,6 milhões de pessoas deixassem de pagar o imposto, ampliando a isenção para 16,3 milhões de pessoas.
A proposta do atual governo, por sua vez, prevê isentar cerca de 10 milhões de pessoas do IR, fazendo com que 90% dos declarantes fiquem na faixa de isenção total ou parcial.
O projeto da equipe econômica do ex-presidente Bolsonaro também previa a atualização da tabela de alíquotas do IR por faixas salariais, desatualizada desde 2015. Essa atualização completa não consta da proposta petista, que mantém a defasagem do IR para todos que ganham R$ 7 mil ou mais.
Além disso, o plano de Guedes previa ainda um desconto simplificado de 20% para todas as pessoas que recebessem até R$ 40 mil por ano. O objetivo do governo era manter a simplificação para quem tivesse menor renda e estimular contribuintes com renda acima desse valor a pedir nota fiscal e solicitar deduções.
Guedes falou em “coragem” para taxar lucros e dividendos
O projeto foi entregue em junho de 2021 por Paulo Guedes a Arthur Lira, então presidente da Câmara. Após sofrer modificações, foi aprovada pelos deputados já em setembro daquele ano. Depois, porém, “estacionou” no Senado. O relator da proposta na Casa, senador Angelo Coronel (PSD-BA), criticou o projeto de Guedes em várias ocasiões e defendeu substituí-lo por um novo texto. A proposta não avançou desde então.
Além da isenção no IR, a versão original do PL 2337/2021 também previa a taxação de lucros e dividendos. Na ocasião, Guedes disse que essa proposta era um “marco”, pois o país havia taxado empresas e assalariados por 40 anos, sem ter tido “coragem de tributar os rendimentos de capital”.
Medidas compensatórias visavam evitar risco fiscal da proposta
A taxação de lucros e dividendos buscava compensar as perdas arrecadatórias causadas pelas isenções e reduções no IRPF e pela redução de alíquotas do IRPJ, cobrado das empresas. Para isso, a equipe econômica estabeleceu uma alíquota de 20% sobre os dividendos, com faixa de isenção até R$ 20 mil mensais ou R$ 240 mil anuais.
No projeto do governo Lula, a compensação da renúncia fiscal causada pela nova faixa isenta do IRPF será feita por meio do imposto mínimo, aplicado a rendimentos mensais acima de R$ 50 mil (R$ 600 mil anuais).
Cálculos considerando as deduções de valores já pagos em IRPF demonstraram que, na prática, somente pessoas que recebem acima de R$ 100 mil mensais (R$ 1,2 milhão por ano) terão que pagar mais do que já pagam hoje.
Outra compensação prevista na proposta do governo Bolsonaro era a alíquota de 15% para tributar os investimentos em renda fixa, fundos abertos e fechados (multimercados), extinguindo a tabela regressiva. O mesmo percentual seria aplicado a investimentos em bolsas de valores, mas com apuração trimestral.
Outros pontos da reforma do Imposto de Renda proposta por Paulo Guedes
Além das mudanças já citadas, a proposta de reforma do Imposto de Renda de Paulo Guedes incluía alíquota de 5% sobre a atualização de valores patrimoniais de bens imóveis.
O percentual poderia ser aplicado anualmente à valorização de qualquer imóvel, tendo o preço de compra como referência. Atualmente, as alíquotas variam de 15% a 22,5% sobre a diferença entre o preço de compra e o de venda.
Reforma do IR de Guedes também incluía redução de alíquotas para empresas
O projeto de Guedes também propunha reduzir o Imposto de Renda de Pessoas Jurídicas em cinco pontos percentuais – 2,5 no primeiro ano e igual redução no ano seguinte. De 15% em 2021, a taxação cairia para 12,5% em 2022 e para 10% em 2023.
A proposta previa ainda o fim dos Juros sobre Capital Próprio (JCP), uma forma de distribuir lucros entre acionistas. Esse mecanismo é utilizado para reduzir a base de incidência da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ).
Guedes afirmava que, em um mercado de crédito mais evoluído e com juros menores, benefícios como esse, para incentivar o empresário a investir na própria companhia, não eram mais necessários.
Em reação à proposta atual do governo, que prevê o imposto mínimo para grandes rendas, uma solução que tem sido aventada por empresas para reduzir a base de incidência do IR é a transformação de dividendos em JCP.
Deputados apresentam propostas para alterar reforma da renda de Lula
Uma proposta alternativa à reforma do governo Lula foi apresentada pelo PP, partido de Lira. O texto mantém a isenção do IR em R$ 5 mil, mas com formas distintas de compensar a perda de arrecadação causada pela medida. Além disso, prevê alterações no imposto mínimo sobre altas rendas, elevando o piso de R$ 50 mil mensais para R$ 150 mil.
Deputados também já solicitaram que outros quatro projetos relativos ao Imposto de Renda sejam apensados à proposta do governo, de forma que sejam considerados na elaboração de um substitutivo.
Uma dessas propostas, do deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), eleva a faixa isenta de IR para R$ 10 mil, mas sem apresentar qualquer compensação para a renúncia fiscal.
O atual presidente da Câmara, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), já sinalizou ao governo que a Casa fará suas contribuições. Durante o lançamento do projeto, ao lado de Lula e do vice-presidente, Geraldo Alckmin, Motta afirmou que as alterações necessárias serão feitas.
Como está a tramitação da proposta para reforma do Imposto de Renda do governo petista
Atualmente, o PL 1087/2025 encontra-se em análise na Câmara dos Deputados. A tramitação teve início no dia 19 de março, e a Casa precisa dar um parecer sobre o projeto até o dia 2 de maio.
No início de abril, foi aprovado requerimento de urgência para a tramitação do projeto e criada uma Comissão Especial para sua avaliação, presidida pelo deputado Rubens Pereira Júnior (PT-MA), vice-líder do governo na Câmara.
Também já foi aprovada a realização de uma audiência pública para avaliação da proposta, que, até o fechamento desta reportagem, seguia sem data marcada para ocorrer.
Fonte: Gazeta do Povo – Por Roberta Ribeiro