sexta-feira, abril 19, 2024
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Hospital São Salvador: o legado de Dr. Paulo Joaquim da Fonseca para Além Paraíba

Dr. Paulo Joaquim da Fonseca, médico idealizador do Hospital São Salvador. (Foto: Arquivo Jornal Além Parahyba)

O ano de 1895 foi de grande provação para Além Paraíba, debaixo do ponto de vista saúde.

Desprovida de meios de defesa sanitária, sem água potável, rede de esgoto, hospitais de isolamento, sem higiene pública e privada, indefesa enfim, era natural que sofresse como sofreu, os efeitos desastrosos das epidemias de que foi vítima.

Foi um ano marcado pela morte e dor devido as três epidemias que aqui irromperam: a primeira, de cólera, a mais terrível pelo pavor que causava ao enfermo que muitas vezes falecia em poucas horas depois de atacado pelo mal e que durou quatro meses; seguiu-lhe a febre amarela que fez numerosas vítimas; e finalmente a varíola, não menos terrível e apavorante, à época, do que as primeiras.

Incumbido pelo Governo da então Província de Minas Geraes a superintender os serviços de profilaxia e combate à primeira e terceira dessa epidemia, chegou a Além Paraíba Dr. Paulo Joaquim da Fonseca, um médico de descendência afro-baiana de Salvador, que compreendeu, pela dificuldade quase insuperável, que era materialmente impossível um ataque eficaz a qualquer “morbus epidêmico” sem os meios de defesa naturais e, principalmente, sem hospitais de isolamento.

Fez então construir barracões para isolar doentes, chegando à conclusão que em verdade os Governos gastavam grandes somas na obra de combater o mal, com um único efeito – enterrar os mortos. Tal maneira de pensar o fez extremar um franco relatório ao Governo da Província e, na mesma ocasião concebeu a idéia de prover em Além Paraíba a fundação de um hospital que preenchesse inteiramente os seus fins, isto é, que pudesse receber e tratar doentes com dignidade, respeito e igualdade de tratamento.

Apelou à generosidade do povo da época, ganhou inúmeros adeptos e o apoio necessário. Forte no cumprimento do seu dever social e profissional juramentado, tudo esqueceu para só pensar em auxiliar o não e o carente, erguendo um monumento digno de sua civilização e de sua cultura e que ao mesmo tempo fosse a defesa permanente de sua saúde e de sua vida.

Luis de Souza Breves, o Barão de Guararema, grande benfeitos e primeiro provedor do Hospital São Salvador. (Foto: Blog Mauro Luiz Senra Fernandes)

O empreendimento era grandioso para os seus ombros, porém, o auxílio de Luis de Souza Breves, o Barão de Guararema, e sua digníssima esposa, dona Francisca de Souza Monteiro de Barros, veio em boa hora amparar a nascente da instituição, com o donativo de 10 contos de réis. Tal donativo transformou o benfeitor no primeiro sócio-benemérito da sociedade ora formada, determinando que seu retrato fosse colocado no salão nobre do hospital (tal retrato desapareceu e ninguém sabe onde foi parar).

De posse dos primeiros recursos financeiros, tratou Dr. Paulo Joaquim da escolha do local para construção do hospital. A topografia da cidade dificultava a escolha de um local de total isolamento e que pudesse ser colocado de modo a servir os três núcleos que a formava – São José, Oficinas da Estrada de Ferro Leopoldina Raiwals e Porto Novo. Finalmente, entendeu-se com Antônio Cândido Pereira, proprietário de um morro agreste e conseguiu a doação do local destinado à construção do nosocômio. Sob a direção do engenheiro Leon Gilson, então funcionário da Câmara Municipal, e do também engenheiro E. Muller, a audaciosa obra teve início no dia 02 de julho de 1896 e no dia 12 de outubro do mesmo ano colocava-se a primeira pedra do edifício principal.

Prosseguiram os trabalhos e vieram as doações, as quermesses organizadas pelas senhoras da sociedade alemparaibana, e levantou-se 19.917.850 réis. A seguir, abriu-se concorrência pública para a construção do edifício principal, e Lair Lopes Ribeiro, conhecido e honrado construtor, ganhou com uma proposta de 46.000.000 réis. Mais doações e mais quermesses, e, em fins de 1897 a obra teve que parar por total falta de recursos financeiros.

Até o dado momento, nenhum auxílio fora dado por parte dos poderes públicos. A Câmara de então, votou uma lei doando as importâncias dos impostos à grandiosa obra. O resultado final foi o patrimônio de 17 apólices no valor de 3.400.000 réis da Dívida Municipal que, infelizmente, as administrações posteriores vieram a revogar arbitrariamente (a prática da politicagem já existia).

Buscou-se o auxílio da Igreja Católica através do Dom Carloto Fernandes. Porém, com a demora de resposta do bispo, resolveu-se fundar uma Sociedade Civil e em assembleia realizada no Paço Municipal, a 02 de novembro de 1902, empossou-se a primeira diretoria que indicou como provedor o benemérito Barão de Guararema.

Com a organização da Sociedade de Santa Casa da Misericórdia, tornou maior impulso a idéia de conclusão das obras e, em 02 de junho de 1903, sob a supervisão de Pagano Bruno, reiniciaram-se os trabalhos.

Mais donativos, concertos musicais no Teatro São José, mais quermesses e algumas poucas, mas sempre bem-vindas, verbas governamentais, fazia com que o edifício principal se concluísse aos poucos.

Em 19 de julho de 1908, Dr. Paulo Joaquim da Fonseca manda publicar um amplo relatório, onde diz: “Farei desta Casa um reduto de defesa à vossa saúde e dos nossos semelhantes e um templo de Amor ao próximo, onde se pratique a Caridade, essa medicina que emana do Céu, para acalmar as dores e suavizar o infortúnio dos desamparados da sorte, a Caridade que aprendemos nos ensinamentos do Evangelho, a Caridade paciente e benigna, que sabe sofrer e esperar, aureolada sempre pela cintilação da Fé”.

Hospital de Caridade em São José de Além Paraíba, com denominação jurídica Sociedade de Santa Casa de Misericórdia, nos dias atuais Hospital São Salvador: quanta luta em favor da assistência ao não e o carente povo alemparaibano para a sua conclusão!

Salão Nobre do Hospital São Salvador. (Foto: Blog Mauro Luiz Senra Fernandes)

Fonte: Jornal Além Parahyba, edição nº 174, de 1º de dezembro de 2000.