segunda-feira, abril 29, 2024
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Projeto de filha de Eduardo Cunha prevê prisão a quem criticar políticos e autoridades

A autora da proposta é filha do ex-deputado Eduardo Cunha (MDB-RJ), que chegou a ser condenado a mais de 55 anos de prisão em três processos por corrupção. Ela também foi alvo de investigação.

A proposta é de Dani Cunha, filha de Eduardo Cunha. O ex-deputado acaba de ter sua condenação na Lava Jato cancelada, de forma questionável, por uma decisão do STF. Cunha teve revertida a pena de mais de 55 anos de prisão em três processos por corrupção| Foto: Redes sociais / Reprodução

Por pouco, a Câmara dos Deputados não aprovou, no dia 06 de junho, um requerimento de urgência para votação do Projeto de Lei 2.720/23 da deputada federal, Dani Cunha (União-RJ). A proposta que criminaliza comportamentos considerados discriminatórios contra políticos e autoridades e viola direitos garantidos na Constituição foi retirada de pauta por falta de consenso entre os líderes. Entretando, o mesmo projeto retornou a votação ontem, dia 14 de junho, sendo aprovado na Câmara dos Deputados pelo placar de 318 votos favoráveis e 118 contrários.

A autora da proposta é filha do ex-deputado Eduardo Cunha (MDB-RJ), que chegou a ser condenado a mais de 55 anos de prisão em três processos por corrupção. Dani também foi alvo de investigação.

No último dia 29 de maio, na esteira do entendimento que descondenou Lula por suposta incompetência da Justiça do Paraná, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu pela anulação de uma decisão que havia condenado Eduardo Cunha por recebimento de propina no âmbito das investigações da Lava Jato.

Na justificativa do projeto, Dani Cunha defende o princípio da presunção de inocência dos políticos. “A discriminação praticada em virtude tão só da posição política ou por se encontrar na situação de parte em processo judicial precisa ser expurgada da nossa sociedade, prestigiando as proteções fundamentais concedidas pela Carta Maior”, diz um trecho da justificativa.

Carlos Barros, advogado especialista em direito eleitoral, explica que a proposta, caso seja aprovada, colocará em risco a liberdade de expressão, a livre manifestação do pensamento e outras garantias constitucionais. A iniciativa também violaria a presunção de inocência de quem veicular uma opinião.

“O efeito prático do PL 2720/2023 é submeter a soberana opinião popular a processos burocráticos do Estado. Desenhando: se eu chamar de ladrão um político, se este político não teve esgotados todos os infinitos recursos disponíveis, em todas as instâncias, até a suprema delas, eu estarei incorrendo em discriminação, com pena de reclusão, de dois a quatro anos, e multa”, explica.

“Isto vale para a opinião individual, para a de veículos de imprensa, para eventual embaraçado na assunção de cargos e funções públicas, e até para possíveis senões na movimentação financeira em instituições bancárias. A presunção de inocência foi transformada em certeza de inocência, no caso de políticos. Já o cidadão, este passou de inocente presumido, a culpado manifesto”, continuou.

Modelo ditatorial

O projeto de Dani Cunha fere, claramente, a liberdade de expressão e flerta com imposições de regimes totalitários, a exemplos de ditaduras como Cuba, Nicarágua e Venezuela.

Curiosamente, no último dia 31 de maio, a deputada foi às redes sociais criticar a presença do ditador venezuelano, Nicolás Maduro, no Brasil.

“Receber com honras um ditador já é vergonhoso para o nosso país. Agora, permitir violência a uma mulher em pleno exercício da sua profissão é inadmissível”, disse a parlamentar em referência à agressão sofrida pela jornalista Delis Ortiz, que levou um soco no peito de agentes que faziam a segurança de Maduro, a quem Dani Cunha chamou de “criminoso”.

Uma das medidas adotadas por Maduro para se manter no poder foi a criminalização dos adversários. Na Nicarágua, o ditador Daniel Ortega tem perseguido cristãos e encarcerado padres e bispos por críticas ao regime.

Recentemente, um relatório produzido por ativistas dos direitos humanos apontou que todos os presos políticos de Cuba são torturados.

Iniciativas semelhantes à proposta de Dani Cunha para punir críticos também podem ser contempladas em outros regimes repressores, como Coreia do Norte, China, Irã, Vietnã, Turcomenistão, Guiné Equatorial, Arábia Saudita e Eritréia, considerado o país mais censurado do mundo de acordo com uma lista compilada pelo Comitê para a Proteção dos Jornalistas.

Contradição

No início do mês passado, a deputada Dani Cunha comemorou o adiamento da votação do Projeto de Lei 2.630/20, também conhecido como PL das Fake News ou PL da Censura. Apesar de se posicionar contra o projeto que visa, na prática, censurar opiniões e perseguir críticos do atual governo, a parlamentar disse ser “a favor de regulamentar as fake news” para combater os estragos ocasionados por “assassinatos de reputação” na internet.

Agora é por conta do Senado

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), declarou que “não sabia sequer da existência” do projeto de lei aprovado pela Câmara dos Deputados ontem, quarta-feira (14), que propõe tornar crime a discriminação contra políticos. A declaração foi feita em entrevista a jornalistas nesta quinta-feira (15). Com a aprovação na Câmara, o texto deverá, agora, ser analisado pelo Senado, passando por comissões e pelo plenário.

“Desculpa, eu não conheço esse texto. Eu não sabia sequer da existência desse projeto na Câmara. Mas, obviamente, aprovado na Câmara, ao chegar ao Senado, nós vamos conhecer o texto e identificar por quais comissões ele deva passar. Mas eu não conheço o texto, não posso opinar”, afirmou Pacheco.

O projeto prevê pena de 2 a 4 anos de cadeia para quem “injuriar alguém somente em razão da condição de pessoa politicamente exposta”, além de multa. Em meio à polêmica, esse ponto do projeto foi retirado pelo relator, deputado Claudio Cajado (PP-BA), poucos minutos antes da votação do texto. Ele alegou que já é crime praticar injúria contra qualquer pessoa, não necessitando criar um novo tipo penal para injúrias contra aquelas “politicamente expostas”.

O que foi mantido no texto que foi votado de aprovado na Câmara foi a criminalização de quem negue a celebração ou a manutenção de contrato de abertura de conta corrente, concessão de crédito ou de outro serviço a quem seja politicamente exposto.

Fonte: Gazeta do Povo

An Quim